VERSO LIVRE































Ao Anjo do Engenho do Pau d`Arco ( I )
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e quando o último dos últimos julgar, assim,
que toda esta vida é finda, é morta.
eis-me aqui, no fim de todo fim
fechando a porta.


(Alexandre Marcante - 1987)






Ao Anjo do Engenho do Pau d`Arco ( II )
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ah este caminho não é meu
e a cova em que eu deitara e fiz de leito
não é a minha, e o paletó que uso é o seu
até o coração neste meu peito, veio bater meio sem jeito
questionando a meu respeito, e  em que momento o meu cadáver se perdeu


(Alexandre Marcante - 1987)










Sabiá Primavera ( no tempo do amor)


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só tu sabes sabiá
quanta dor no peito há
desde quando ela partiu
tu passaras a cantar

só tu sabes sabiá
quanta dor no peito há
uma canção que se ouviu
sobre nunca mais voltar

só tu sabes sabiá
quanta dor no peito há
quanta dor já se sentiu
se outro amor vai curar

só tu sabes sabiá
quanta dor no peito há
se essa dor diminuiu
e quanto tempo esperar


MARCANTE, Alexandre – 06 de junho de 1987.

©AMS publicações & Casa das Letras. 676541/901091 - 933.: Todos os direitos reservados do autor.









Nem "seje" nem "menas"
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Povo que come nos pastos
De "Nem seje e nem menas"
Onde só há poetastros
Que rimam às duras penas

Mas a vida é mesmo assim
Vezes mole, vezes dura
E vão comendo capim
E usando ferradura

Pois venho então redimi-los
Servindo-lhes o próprio feno
Aqui produzido aos quilos
para que "seje", seja "seja" e "menas", seja "menos"


(MARCANTE, Alexandre)
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Eu moro longe
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Eu moro longe
Tão longe, que o vento se perdeu
Antes de me achar

Eu moro longe
Tão longe, que o amor morreu
Antes de me matar

Eu moro longe
Tão longe, que pensei ser sonho meu
Antes de ir pra lá


MARCANTE, Alexandre. 
©AMS Editores & Casa das Letras Musicas/publicações 1988. 442820/216800 - 231.: Todos os direitos reservados do autor.




Paulinho da Baiana

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Chapéu de palha
Anel gurufinho
Navalha
Dente de ouro
Paletó de linho
Pisante de couro

Gafieira, carteado
Capoeira, mulata vadia

Exu Caveira na guia !


(MARCANTE, Alexandre)
AMS® publicações 1987 - 821876/090230 - 436 todos os direitos reservados.











PÁRIS
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Doa.
Confia seu próprio tempo 
Única riqueza não impura
Àqueles que nunca pedem ouro ou reinos

Luta.
Outros níveis
Campos improváveis e sem perspectivas
Terras miseráveis

Fato.
Não há sonhos como os nossos
Viver não faz todo ou o mesmo sentido
Tudo é mais, tudo é menos e sempre

Pensa.
Glórias vazias e honras invisíveis
Livre – arbítrio – infecto
Mentes incognoscíveis

Muda.
É tudo ou nada
Solos áridos, solidão, solidários
Caminhos que não existem, virão

Vida.
Perguntas incompletas
Respostas evasivas, à fome, à sede
Lembra? O tempo? Elas serão vencidas

Ajuda.
Põe as mãos nas feridas
Flores expostas, rosas vermelhas e mortalhas
Carne viva – só é preciso viver –

Beija.
O amor é outra coisa, há cura
Onde a dor é sempre a mesma queixa
- A mentira é sempre a pior doença! –


(MARCANTE, Alexandre)
AMS® publicações & Casa das Letras, 1999 - 871216/918039 - 559 todos os direitos reservados.









É CEDO
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Acorda cedo

Com o medo
Com o galo, as galinhas
O cheiro de café
Na casa da vizinha
O sexo
Acorda cedo
Em silêncio
Em segredo
Em estado de graça
Na desgraça
Sozinho
Perplexo
Suando, suando, suando 
O suor
O veneno
O vinho, a cerveja, a cachaça
O medo
Acorda cedo

A conta

A conta
A conta

O juro

O juro
O juro

O mormaço, o cansaço, a fornália, o abrigo

Acorda cedo
No escuro
O obscuro
O obsceno
O castigo
O futuro

Ó morto!

Ó macaco!
Ó morcego!

À batalha, é cedo.



(MARCANTE, Alexandre)

AMS® publicações & Casa das Letras. 2004 - 810592/000339 - 122 todos os direitos reservados do autor.










CARNIÇA
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Pássaro
Pássaro
Ainda não sei voar
À beira do abismo absoluto
Não posso cair
Não quero me atirar
Eu luto
Eu luto
Começo a cantoria, não sei cantar
Começa a choradeira, não consigo chorar
Eu rio
Eu rio
De tristeza, surpresa, idiotice, ouvidos moucos

    - Senhora, a fila andou mais um pouco?!

Pássaro carnívoro
Assobio
Assobio
Disfarce
Disfarço-me de vivo
Enfim, não há fim que não perdure
Enfim, não há ainda um fim vigente
É frio
É frio
É quente
É quente
O urubu
O urubu
O fedor
O fedor
O fim
O fim

 À beira do abismo há um bando de gente


MARCANTE, Alexandre – 02 de julho de 1986. 
AMS® Editores textos/publicações & Casa das Letras.  677001/910182 - 340.: Todos os direitos reservados do autor. 




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O SENTIDO DE MINAS


Eu vou pra Minas.

Que lá, tudo faz sentido
O “trem” faz sentido

Faz sentido 
A luz, o ouro, o céu
O amor, a flor, o mel

Eu vou pra Minas.

Que lá, tudo faz sentido
O lobisomem faz sentido

Faz sentido
O leite, o café, o queijo
A fé, o uai, o beijo

Eu vou pra Minas.

Que lá, tudo faz sentido
A cor, faz sentido

Faz sentido
A poesia, a sapiência, o segredo
A dor, a alegria, o medo

Eu vou pra Minas.

José, Carlos Drummond, Bené
Até Bandeira voltou de Passárgada

Todos foram pra Minas
Até o mar foi pra Minas
Minas, faz sentido

Eu vou pra Minas.


(MARCANTE, Alexandre).AMS® publicações & Casa das Letras. 1999 - 662345/090967 - 733 todos os direitos reservados.

6.6.10


GUERRA E PAZ (os dias & as noites)

As casas tinham a laje fria
E nelas, envoltas em floras amarelas
Não havia portas, e nem janelas havia

Nos galhos, blindados de cristais
Namoravam, a sós, um belo par de cotovias
E dele, o som que inda se ouvia no entardecer lilás

A cor do dia agonizava o éter do infinito inda sem luzes
E ao passo que contra o infalível breu perdia inglória luta
O negro véu vencia impávido, o conflito, anjos, almas e cruzes
.
.
.
.

MARCANTE, Alexandre – 02 de junho de 1987.
©AMS publicações & Casa das Letras. 312388/067584 - 772.: Todos os direitos reservados do autor.

20.1.08















A BOMBA INCOGNOSCÍVEL

A bomba e sua origem desconhecida

Ignota!

A bomba e sua mente poluída

Idiota!

A bomba e sua alma corrompida

Clonada!

A bomba e sua vida sem vida

Viciada!

A bomba e sua raiz quadrada

Matemática!

A bomba e sua raça automatizada

Problemática!

A bomba e sua crença robotizada

Fanática!

A bomba e sua marca registrada

Importada!

A bomba e sua nova máquina

Microcomputadorizada!

A bomba e sua antena diabólica

Parabólica!

A bomba e sua tese política

Analítica!

A bomba e sua nova ordem mundial

Neo-imperial!

A bomba e sua fina gravata

Autodidata!

A bomba e sua palavra incompleta

Analfabeta!

A bomba e sua velha carcaça

Aposentada!

A bomba e sua nova bomba

Safenada!

A bomba e sua nova pílula

Falsificada!

A bomba e sua vasta filharada

Esfomeada!

A bomba e sua carteira pelada

Desempregada!

A bomba e sua marmita vendida

Privatizada!

A bomba e sua existência errada

Deturpada!

A bomba foi manipulada

A bomba foi engravidada

A bomba foi globalizada

A bomba foi estuprada

A bomba foi amputada

A bomba foi desabitada

A bomba foi descamisada

A bomba foi deseducada

A bomba foi desfigurada

A bomba avançou o sinal

A bomba foi multada

A bomba está mal

A bomba está pobre

Mas a bomba quer ser emergente

A bomba quer ser nobre

Mas a bomba está indigente

A bomba está incorrigível

A bomba está ininteligível

A bomba está doida

A bomba vai às urnas

- Atenção!

- Contagem regressiva:

- Dez!

- Nove!

- Oito!

- Sete!

- Seis!

- Cinco!

- Quatro!

- Três!

- Dois!

- Um!
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.
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(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 1996 - 966291/271991 - 115 todos os direitos reservados.

Prêmio Criarte de Literatura, ETEVM, 1999. (POESIA DE CUNHO SOCIAL).

8.12.07


POEMA DA INANIÇÃO

Homem cheio de fome

Mundo de estômago fundo

Caixão de trigo vazio

Estômago fundo de fome

Mundo cheio de homem

Homem vazio de trigo

Estômago vazio e fundo

Caixão estômago mundo

Mundo cheio de fome

Caixão cheio de homem

.

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(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações & Casa das Letras. 1996 - 971418/229485 - 111 todos os direitos reservados.


CAFUNDÓ

Sem eira
Nem beira
Redunda

Dispara
Sem pino
Sem mola

Rola
Sem sorte
Rotunda

Sem tino
Resvala
Esfola

Grita
Afoga
Afunda

Inunda
Pára
Atola

Rebola
Retumba
No fundo

A bola
A Terra
O mundo

.

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.(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 1987 - 030244/771190 - 104 todos os direitos reservados.

4.12.07



ESPELHO MÁGICO

uma pára e olha
ri da outra e depois chora
de toda desgraça ou desventura
que na aventura dessa hora virem
chora e ri por longa hora
e quando já não é meio termo a loucura
sangra, por dentro e por fora
e das lágrimas e gritos que seu corpo expele
há uma estranha mistura agora
enruga a testa e soluça
ofegante, respira como nunca
“chorirri” com refinada amargura
mas, de súbito e com falso espanto
sempre se pergunta
sem medo de ouvir a única e cabível resposta:

-Quem é a mulher que o espelho mostra agora?

seca o rosto
cristalizada ternura
retoca a maquilagem
sem se despedir, vai embora
a outra, submissa e horrorosa
desaparece nas profundezas obscuras do espelho

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.(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 1987 - 821904/921173 - 850 todos os direitos reservados.

1.12.07



QUINTESSÊNCIA


fito airoso arrebol
deixo-me à
correnteza
sigo os passos do sol
tenho-me natureza
em busca da
quintessência
numa jornada infinita
para suprir tua ausência
minha
porção mais bonita
histórias e sonhos vividos
que um dia você me contou
- ai que estivessem perdidos!
meu coração os guardou
eu que inda
sou seu amigo
sem medo, pressa ou dor
nessa viajem, sigo
buscando
ser seu amor

.
.
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(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 1988 - 295831/106296 - 821 todos os direitos reservados.



25.11.07


A PEDRA

Ai, Doutor! Pare essa pedra.
Esse cálculo renal
Que em mim, anda
Desgovernadamente procurando um canal.
Obcecadamente,
Vai em sua douda sina
E uretralmente falando, pára.
Impedindo a ardente urina.
Ai, Doutor! Dê-me a morfina-flôr
Dentro de mim agora queima um sol
Ó! Famigerada dor,
De conta-gotas, encho o urinol.
Ó! Laser supremo!
Raio certeiro!
Atinja com seu poder extremo
Calculadamente, o sol inteiro.
-Volte logo. Dizem “eles”.
Digo - Ó! Doutor! Ainda estou febril.
E a dor não é neles. - Puta que o pariu!
Dê-me logo o Bom Bril
Que esfregarei na cara deles.
Num tratamento fino,
Puseram em mim um cateter
Buscopan, Norfloxacino...
Mas em lugar de urina parece que sai éter!

Ai que dor! Putz!


.

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(MARCANTE, Alexandre).
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(A Epopéia da Pedra – p.127 Editora Marcante Quase Cultural . 2004)

MPB

Music from Brazil
Acaso uma puta
Foi quem a pariu

Pai, desconhecido
Talvez de todo o povo
Terá ela nascido

Logo, se perdeu
No mundo ela caiu
E deu no que deu

Cansou de ser ouvida
Transou com todo mundo
Será que está perdida?


Escuta! Escuta! Escuta!
Ela está na calçada da fama
E também na de Copacabana

Prostituta
Música do Brasil
Música de luta

Puta, à toa e rameira
Que todo mundo já ouviu
Música Popular Brasileira!
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MARCANTE, Alexandre.
AMS® publicações 2006 - 821144/008538 - 531 todos os direitos reservados.

CORAÇÃO SOLIDÃO

O meu coração não é de pedra
Mas quando partes, sem razão
O meu coração se quebra

Junto os pedaços, com fé
Mas como colar um coração
Que nem de pedra mesmo é?

Na solidão eu fico a pensar
Com os cacos em minhas mãos
No dia em que fores voltar

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(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 2003 - 614029/550911 - 772 todos os direitos reservados.

DIA DAS MÃES

Triste, eu volto pra casa
Pois sei que ela nunca está lá
Mas tenho em mim a esperança
De um dia podê-la abraçar

Onde estará minha mãe?
Eu fico a me perguntar
Só sei que não vem me cobrir
E muito menos beijar

Os carros passam lá em cima
Desse meu lar-viaduto
Meu corpo todo estremece
Mas contra o medo reluto

Eu fico a fitar as estrelas
Que luzem lá entre o vão
Em minha cama macia
Feita de papelão

-Ó Amiguinhas do céu!-
Encontrem-na para mim
Permitam que só neste dia
Minha tristeza tenha fim


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(MARCANTE, Alexandre).
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POEMA DE ASSALTO


Como dum coldre sacado
Revolvo revólver em punho
Um poema engatilhado
Em sua vida eu rascunho
Tomando-a assim de assalto
Em pleno onze de junho

-Mãos para o alto!

.

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(MARCANTE, Alexandre)
AMS® publicações. 991220/8362895 - 024 todos os direitos reservados.



A INVENÇÃO DO AMOR

A dor do poeta é o Amor
E enquanto escreve ele inventa
Que nunca sentiu ser Amor
A dor que nem mesmo agüenta

Tão fingida é a dor que bem sente
Que quando deveras for
Doer-lhe-á tão profundamente
Que quase morrerá de Amor

Pobre poeta escritor
O Amor em seu peito clama
Não pode enganar a dor
Nem pode fingir que não ama
.
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(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 2006 - 274984/784003 - 782 todos os direitos reservados.


RECICLO
No fim de cada dia
Eu pego meus momentos

(separo, divido, segmento)

O que for bom vira poesia
O resto se perde no pensamento
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(MARCANTE, Alexandre).
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AMOR DE MARIA

Hoje sou toda dor
Uma dor que é só minha
Uma dor sem pudor
Uma dor que eu não tinha

Hoje sou toda dor
Uma dor que me toma
Que me deixa o amor
Mas me põe nesse coma

Hoje sou toda dor
Uma dor que me cala
E transforma em pavor
Essa voz que vos fala

Hoje sou toda dor
Uma dor tão ingrata
Que nem mesmo ao amor
Essa dor já não mata

Hoje sou toda dor
Uma dor de agonia
Mas cheia de amor
Um amor de Maria
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(MARCANTE, Alexandre).
AMS® publicações 1999 - 739388/080552 - 644 todos os direitos reservados.